Entrar no Parque Lage e não se
encantar com o local é uma tarefa quase impossível para qualquer um. O oásis
natural em meio à modernidade da metrópole abriga jardins construídos nos
moldes europeus, chafariz, palmeiras imperiais, locais para descanso, cursos
artísticos e uma exuberante vegetação.
A mansão dos Lage – hoje tombada como
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - possui, além da Escola de Artes
Visuais, algumas exposições artísticas por suas dependências. Entre as amostras
de dezembro, encontram-se "Tempo
Vero", de Leonardo Tepedino, "Ferramental
para Fábulas", de Fábio Naranno e "Mais
Luz", de Fábio Naranno e Gustavo Torres.
37 GRAUS DE PURA ARTE
Mochila nas costas, bloco de
anotações na mão esquerda. Caneta na mão direita. Máquina fotográfica a tira
colo e as gotas de suor que não deixavam esconder aquela agradabilíssima temperatura
que girava em torno de 37ºC. Amado pelos turistas, venerado pelos cults, recanto
de pássaros e árvores, lugar perfeito para um piquenique de fim de tarde. Lá
estava ele, escondido por um muro tomado de musgos e convivendo harmoniosamente
com a movimentada rua Jardim Botânico: o magnífico Parque Lage!
Seguindo o caminho dos antigos
paralelepípedos do chão ou preferindo uma "aventura mais selvagem"
por entre as árvores e seus troncos, chega-se, rapidamente, às Cavalariças (onde estava "Tempo Vero", exposição de Leonardo Tepedino). O
amplo salão dispunha, em suas instalações, de duas imensas estruturas feitas de
madeira, que, a princípio, pareciam não ter forma alguma que não a de curvas aleatórias
sem muita finalidade. Porém, um observador mais atento percebe que aqueles
monumentos não foram feitos sem propósito e que existe um sentido por trás de
tudo aquilo: as peças esculpidas lembram as pernas de uma aranha. São
estruturas que fazem referência à arquitetura renascentista de Brunelleschi,
que permitia visões tridimensionais de sua arte. E aí é que se encontra todo o
encantamento do observador dessa obra de arte: as pernas, nervuras e
articulações da aranha vão expandindo e moldando-se conforme a disponibilidade
do espaço, que vai sendo posto à prova a cada curva e ângulo da madeira
esculpida. Segundo a crítica Marisa Flórido César, “É como se o mundo, aos
poucos, fosse abandonando o rígido molde que o constringia, as leis e as
regularidades que o ordenavam.”
Ao andar um pouco mais em direção ao
palácio do Parque observava-se, logo no hall de entrada, alguns outros
trabalhos, tais como pedaços de autorama pintados de branco (que, dispostos
como estavam, formavam um belo desenho), uma grande minhoca (ou cobra, lagarta,
lesma e o que mais a imaginação permitir) feita a partir de tampas
multicoloridas de diversos recipientes, entre outros.

Rumo ao subsolo da casa, descendo as escadas, em uma galeria aparentemente “secreta”, desconhecida pela maior parte
dos visitantes do Lage, estava uma das exposições mais criativas de todos os
tempos da última semana: “Ferramental para Fábulas”. Fábio
Naranno, o artista, dispôs inúmeras esculturas de modo que parecessem suspensas
no ar e mexessem com o imaginário dos visitantes que fora esquecido na infância.
Aquelas diversas figuras eram, simultaneamente, estranhas e familiares: faziam recordar
imagens e personagens perdidos no tempo e na memória. Ninguém melhor que o
próprio artista para explicá-las: “Do prazer inocente da brincadeira
imaginativa de uma criança, que transforma objetos banais nos mais mirabolantes
brinquedos, nasce a ideia do trabalho que propõe ao espectador criar um tempo
em suspensão, de memória, um mundo fabuloso que conte uma história, a partir
das ferramentas exibidas a ele como ponto de partida para uma construção
fantástica de infinitas possibilidades onde cada um apreende, absorve e
expande o que quiser entender, o que contém dentro de si. Construa a sua
própria fábula!”
Ainda naquela espécie de “porão
artístico” (o subsolo que abriga artes, em questão), estava exposta outra parte
da coletiva “Mais Luz”. Ela era composta por um antigo projetor que
reproduzia o filme de um bebê em telas de pano. Era como se fosse possível ver,
materialmente, o que só se faz presente na consciência: a memória. A imagem
borrada e desfocada, as cores inexatas, a textura do pano, a disposição do
tecido, o escuro ao redor. Tudo fazia com que aquela imagem parecesse
lembrança, passado. Nas palavras de Gustavo Torres, um dos autores: “Por agora,
me interessa o que já está. A matéria, a memória; e esperar que o olhar, a
relação crie o porvir. A partir da projeção de filmes em super 8, garimpados em
feiras – estes repetem, retornam, até que rompem – , investigo os processos da
memória. Descarte e esquecimento, lembrar – atualizar, ato versus superfície,
memória alheia como dispositivo de lembrança íntima. Utilizo projetores,
película super 8, panos, mesa, moviola, entre outros, com dimensões variadas.”
E assim encerrou-se a visita a um dos mais charmosos pontos turísticos do Rio de Janeiro. Um dia de excursão às pernas aracnídeas e minhocas (lesmas, cobras e afins) coloridas, retorno às fábulas infantis, albinos autoramas, passeios pela memória alheia e, é claro, muito calor. Foram os 37º graus mais artísticos de que se tem notícia.
Grupo:
Fabian Falconi
Gabriela Isaias
Laís Januzzi
Mariana Parga
Thiago Patrick







