A Invenção de Morel - Adolfo Bioy Casares
Em
sua obra de science-fiction psicológica,
Adolfo Bioy Casares conta a história de um fugitivo condenado à prisão perpétua
que, em sua fuga, passa a abrigar uma ilha que é notoriamente infectada por uma
estranha peste e que, por isso, não é habitada nem frequentada por qualquer
pessoa.
Atendendo
à máxima necessidade de escapar e sobreviver, o fugitivo se arrisca à ilha
infectada. Em forma de diário, ele escreve sua estadia na ilha, entre lutas de
sobrevivência e momentos de reflexão na tentativa de arquivar sua história e
eternizar sua memória.
Atrapalhando
sua luta pela sobrevivência, o fugitivo passa a perceber a presença de
misteriosos turistas que chegaram à ilha; entre eles, uma mulher que sempre
assistia ao crepúsculo, sozinha em sua beleza e seu olhar distante de
meditação. O personagem principal passa a observá-la em segredo em todos os
fins de tarde e percebe sua paixão pela bela mulher crescer a cada dia. Em sua
vontade de se fazer perceber, começa a pensar em meios de falar com a tal mulher
e a fazer planos para que não a assuste ao se revelar.
Porém,
ao tentar se revelar, percebe que nem a mulher nem os outros turistas pareciam
percebê-lo ali, como se ele fosse invisível ou como se apenas o ignorassem.
Espantado, passa a pensar se isso é devido à sua dieta de sobrevivência, que
poderia tê-lo deixado invisível, se, finalmente, estava sendo atingido pela
peste que assolava a ilha ou se ele mesmo ou os outros seriam fantasmas.
Continua, assim mesmo, observando a mulher todos os dias, até a aparição de
outra pessoa, um homem, que passa a acompanhá-la em sua saudação ao crepúsculo.
Tomado por ciúmes, o fugitivo passa a analisar a conversa entre a mulher e o
detestável homem, descobre que seus nomes eram Faustine e Morel e que suas
conversas se repetiam perfeitamente em dias diferentes.
Se
aproximando cada vez mais do grupo de turistas, o fugitivo descobre que seus
visitantes são apenas “projeções” das pessoas reais que estiveram ali tempos
antes. Essas imagens foram gravadas por um mecanismo inventado por Morel – mecanismo
tal responsável pela radiação infecciosa da ilha –, que em sua tentativa de ter
Faustine pela eternidade, se submete à morte pelas imagens gravadas na ilha,
que se repetiriam eternamente, como é percebido pelo fugitivo.
Não
tendo outra escolha, o fugitivo decide entrar na gravação usando a invenção de
Morel para ser eternizado juntamente com Faustine, querendo apenas existir na
consciência da mulher.
Bioy
Casares, nessa magnífica obra, trabalha o amor idealizado como o desejo da
eternidade ao lado da pessoa amada e como a vontade de ser percebido. Tanto o
fugitivo como Morel foram encantados por Faustine, uma mulher belíssima e quase
surreal, e não sendo correspondido, se submetem à deterioração própria pelo
medo de viver sem tê-la para si. Morel, mesmo convivendo e se relacionando à
Faustine, é ignorado pela mesma – o que, para o fugitivo, é certo de acontecer.
O
romance é o relato de uma história de amor na qual os personagens estão
separados pelo tempo e, também, pela paixão que os une. Não há espaço para o
real na obra, o amor retratado é idealizado e metafísico.
Imagem
significa basicamente representação. Existe uma expressão comumente utilizada:
“Tenho uma imagem a zelar”, ou seja, tenho um molde de como quero aparentar ser
para as pessoas ao redor. E cultivamos “a imagem” por vários motivos, sendo um
dos principais o desejo de ser aceito, de ser amado. Essa representação própria
pode ser construída baseada na suposição ou certeza do que agrada o outro. O
narrador se apaixonou por uma imagem, porém neste caso, uma imagem de uma
mulher que já havia morrido e que ele nunca conheceu.
Essa
história nos leva à análise a respeito da reprodução e projeção realizadas
por meios tecnológicos: a vida pode ser aprisionada e permanecer como vida?
Como isso é possível se a vida é uma sucessão, não uma repetição de fatos? As
imagens eternizadas são postas como um paraíso, para o fugitivo e Morel, porém,
são apenas imagens, por mais realistas que sejam. Não há futuro, não há
sentimentos adquiridos e não há mudança. Tudo permanece estático pela
eternidade e, até possuindo elementos bonitos e sentimentais, pode se tornar o
inferno.
Ao
fim do livro, resta a sensação de que muitos de nós não buscamos viver, somente
nos contentamos com uma imitação de vida. É como se já tivéssemos morrido, mas
ainda não nos demos conta disso. Falta mais coragem para se submeter ao que é
arriscado e que, por sua vez, é muitas vezes o responsável por trazer um pouco
mais de vigor. Mas a vida não é estática, uma hora ela revela a crueldade da
realidade.
Otto
Maria Carpeaux, responsável pelo posfácio da obra, relata que a mesma já foi
classificada como um romance policial, mas que é muito superior a isso. E mais:
acrescenta que “todas as narrações de Bioy Casares são histórias prodigiosas,
histórias para espantar.”.
Por Clarissa Paiva, Letícia Vallecilo, Lívia Maggessi, Marina Vilhena e Priscila Verônica. Turma EC2 - Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

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